quinta-feira, 10 de dezembro de 2009

PARA MEU AMIGO SECRETO ROMMEL WERNECK

Balada do Enterrado Vivo -

Vinícius de Moraes



Na mais medonha das trevas

Acabei de despertar

Soterrado sob um túmulo.

De nada chego a lembrar

Sinto meu corpo pesar

Como se fosse de chumbo.

Não posso me levantar

Debalde tentei clamar

Aos habitantes do mundo.

Tenho um minuto de vida

Em breve estará perdida

Quando eu quiser respirar.

Meu caixão me prende os braços.

Enorme, a tampa fechada

Roça-me quase a cabeça.

Se ao menos a escuridão

Não estivesse tão espessa!

Se eu conseguisse fincar

Os joelhos nessa tampa

E os sete palmos de terra

Do fundo à campa rasgar!

Se um som eu chegasse a ouvir

No oco deste caixão

Que não fosse esse soturno

Bater do meu coração!

Se eu conseguisse esticar

Os braços num repelão

Inda rasgassem-me a carne

Os ossos que restarão!

Se eu pudesse me virar

As omoplatas romper

Na fúria de uma evasão

Ou se eu pudesse sorrir

Ou de ódio me estrangular

E de outra morte morrer!

Mas só me resta esperar

Suster a respiração

Sentindo o sangue subir-me

Como a lava de um vulcão

Enquanto a terra me esmaga

O caixão me oprime os membros

A gravata me asfixia

E um lenço me cerra os dentes!

Não há como me mover

E este lenço desatar

Não há como desmanchar

O laço que os pés me prende!

Bate, bate, mão aflita

No fundo deste caixão

Marca a angústia dos segundos

Que sem ar se extinguirão!

Lutai, pés espavoridos

Presos num nó de cordão

Que acima, os homens passando

Não ouvem vossa aflição!

Raspa, cara enlouquecida

Contra a lenha da prisão

Pesando sobre teus olhos

Há sete palmos de chão!

Corre mente desvairada

Sem consolo e sem perdão

Que nem a prece te ocorre

À louca imaginação!

Busca o ar que se te finda

Na caverna do pulmão

O pouco que tens ainda

Te há de erguer na convulsão

Que romperá teu sepulcro

E os sete palmos de chão:

Não te restassem por cima

Setecentos de amplidão!

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